terça-feira, novembro 25, 2008

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Naquela casa estava escuro, as janelas estavam cerradas à muito tempo, as cortinas, desbotadas, corridas até ao fim- Só alguns fiapos de luz exploravam a escuridão opressiva. Naquela casa o ar era pesado, quilos de anos, de quilos de solidão.
Acumulados.
Naquela casa.
Os putos evitavam aquela casa.
"Está vazia e não está!", diziam eles enquanto os adultos sorriam condescendentes com as suas feições assustadas.
"Claro, claro! Então mantenham-se longe, senão ainda vem o Homem do Saco e mete-vos lá dentro para vos comer!"! E riam. Riam sempre. Eles esqueciam depressa. O que lhes interessava esquecer. Porque, claramente, eles nunca tinham sido crianças, e nunca recearam o desconhecido. Eles não!...
O fumo dos cigarros bruxuleava através das copas das poucas árvores que sobreviviam na orla daquela casa. Dedos trémulos seguravam o cigarro. Indicador e dedo médio marcados pelo odor inescapável da nicotina e da folha e do alcatrão que eles respiravam com vigor. Ele já não queria ser criança. Ele não ia ter medo. Ele queria crescer. Mas quem cresce por mera vontade ou capricho, só aumenta. Só o tempo ou a necessidade nos fazem crescer mesmo, evoluir.
A beata jaz agora esmagada sob a sola das suas sapatilhas. Pretas. Como a roupa que naquela tarde vestia. Como que para espantar os medos que inocentemente julgara parte da infância, da criancice. Ilusão. Quando crescemos com medo, o medo persegue-nos, mais rápido que a idade, mais irrequieto.
O medo.

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